segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Os Encontros Internacionais de RPG (introdução – parte V)

Continuando minha introdução infinita e histórica (no sentido estrito da palavra) vamos ao Encontro Internacional de RPG!

Como já disse antes eu cheguei no primeiro destes encontros sem ter muitas expectativas. Uma dúzia de jogadores compunha meu grupo, eu nunca tinha jogado com outros e no máximo tinha visto pessoas de passagem quando eu visitava a Devir. Não tinha idéia de quantas outras pessoas jogavam RPG e nem como eram. Naquele dia eu tive um curso relâmpago sobre dois assuntos: a “sociedade RPGeica” e a “tecnologia do RPG”.

A sociedade RPGeica

Uma das coisas estranhas que se passavam na minha mente era que em encontros desse tipo só “Mestres Profissionais” mestravam, o que quer que fosse um mestre profissional. Por isso até decidi deixar minhas aventuras “amadoras” em casa e ir só como jogador. Depois me arrependi de não ter mestrado naquele dia (foi o ÚNICO de todos os EIRPG em que não mestrei), já que uma vez lá eu vi que praticamente todos eram crianças como eu. Incluindo os mestres e boa parte dos organizadores. É claro que aqui e ali tinha uns caras “mais velhos” (do alto dos seus 18 ou 19 anos) e até um ou outro adulto, mas a média etária era bem reduzida, o que dá quase para ver na foto abaixo.

Isso é um imenso contraste com os encontros de hoje, essa galera mais jovem dava um ânimo extra aos encontros, tinha mais gritaria, mais risada e mais olhos brilhando cada vez que aparecia um produto novo ou um autor famoso.

Outra coisa que notei foi a cisão GURPS/AD&D, deixada clara logo no inicio por um dos organizadores. Ele estava de pé em uma mesa gritando para tentar organizar o evento, já que a marcação de jogos estava uma zona (divertidíssima por sinal). Soltou ali uma frase que nunca vou esquecer:

TADEU (um gringo de nome tupiniquim): “Quem jogar GURPs, par’ah lá. Quem jogar AD&D par’ah cá...”

Essa era insólita, até porque em qualquer outro lugar do mundo estaríamos falando de uma empresa pequena (Steve Jackson Games), com um sistema pouco conhecido, contra a imbatível gigante TSR e o seu D&D. Mas aqui no Brasil o GURPs tinha sido traduzido e receberia um apoio duradouro e firme da Devir, de forma que ele de fato rivalizou com o AD&D por uns anos (até a White Wolf roubar a cena de ambos). Era engraçado porque, como quase tudo nesse país, o negócio tinha virado briga de torcida, era jogador de GURPs falando mal do AD&D e vice versa. Nos anos que se seguiriam eu me tornaria um ser esquisito que gostava de ambos, hehehe.

Mas enfim, no meio de muita gritaria e ondas de batucada em mesas de metal, eu joguei. E joguei muito! A marcação acabou sendo (como foi na prática por muitos anos) no sistema “ache uma mesa e sente”, o que é totalmente descontrolado mas funcionou bem. Andando entre aquelas mesas eu vi coisas que me eram ainda inéditas.

A tecnologia do RPG

Lembremos que eu estava isolado até ali, então praticamente tudo era novidade. Eu já tinha visto aquelas caixas do AD&D para vender nas lojas, mas naquele dia vi várias delas abertas, com belíssimos mapas, folhetos e outros apetrechos lindíssimos. Por sinal, esses anos do AD&D para mim foram o ápice em termos de ambientação em RPG, as caixas do Dark Sun, Forgotten Realms e outros eram obras de arte que não se vê igual hoje em dia.

Além disso tinha todo tipo de apetrecho improvisado que eu nunca tinha pensado, a final de contas estamos falando da geração xerox (que devia também chamar geração recorte e cole do RPG). Naquela época não dava para imprimir mapas e os mapas prontos eram caros, então a galera usava papel com “contact” e caneta de quadro branco. Outros usavam até “miniaturas” de papel.

Agora tinha uma coisa bem mais básica que tinha até ali me escapado: o famoso “Screen” (conhecido por alguns como Escudo do Mestre). Obviamente eu usava algo para esconder meus segredos (e minhas rolagens de dados) dos meus jogadores, em geral a tampa da caixa preta de D&D, mas não tinha imaginado usar o “tampador” para colocar um monte de tabelas por dentro e desenhos por fora. Dá para acreditar que eu mestrava sem saber o que era um screen? Notem que na época muitos mestres faziam o próprio screen e era uma profusão de coisas toscas e belas. Nem preciso dizer que a semana seguinte foi toda gasta recortando uma caixa enorme e cobrindo-a de desenhos, as tabelas foram uma a uma sendo adicionadas depois. O que saiu foi mais ou menos isto (muitas figuras e tabelas foram adicionadas com o passar do tempo):



Este screen tosco aí tem história. Deve ter estado presente em mais de 100 sessões de jogo e frequentou nada menos que 15 EIRPGs, uns 3 ou 4 Sampa RPG’s, foi uma ou duas vezes até o shopping Pompéia e agora esteve na primeira RPGCon (que tenha vida longa). Tenho certeza que muitos dos meus ex-jogadores ficariam nostálgicos de ver essa foto. Para um pedaço de papelão porcamente coberto de desenhos e tabelas até que é um feito notável.

Os Jogos

Enfim, falando um pouco dos jogos em si, vale a pena ver como as coisas mudam. Repito abaixo o link para a programação do evento. Logo de cara se vê o que já comentei, era 90% GURPs e AD&D, mas também tinha muita coisa diferente. Vale a pena dar uma caçada e procurar algumas das figuras que são emblemáticas no RPG hoje em dia. Vale ressaltar que estas eram as mesas propostas. No fim foi a maior zona, com mestre que se inscreveu e não apareceu, mestre que apareceu sem inscrever e eu acho que ninguém sabe realmente o que rolou. Eu não lembro o que joguei, só que joguei muito.

Notem que eram nada menos que 6 sessões de jogo, das 9 da manhã as 9 da noite. Além do que não tinha muito mais o que fazer. Nesse sentido as primeiras EIRPG eram puristas, tinha só RPG mesmo, com no máximo um wargame aqui ou ali (Battletech, Warhammer e, neste caso, Ogre Miniatures – que por sinal eu joguei com o Steve Jackson).

O Magic já existia mas era pouco conhecido. Os animes ainda eram uma coisa cult e não estavam tão infiltrados nem nos gibis americanos (e desenho e cinema), nem no RPG. Nem gente fantasiada tinha! Era só um bando de moleques sentados em mesas jogando. Quem passava não via nada que não se esperasse de tantos adolescentes juntos, nem sequer o preto era dominante! Até porque o vampire (que trouxe o preto ao RPG) era tão alternativo que só tem uma ou duas mesas aí na programação e quem está mestrando é o ITIRO! (para quem não conhece esse é um dos maiores “alternativistas” do RPG brasileiro). Por sinal, talvez nessa época fosse legal jogar Vampire (hehe, fui mal agora).

Esse clima de alegria e normalidade contribuía muito para divulgar o hobby, que estava crescendo horrores. Conforme a coisa progrediu os Encontros foram se enchendo de pessoas cada vez mais “dedicadas” ao hobby, cada vez mais radicais na sua expressão desse amor. Nada contra, cada um se diverte como quer. Mas temos que reconhecer que isso foi deixando os eventos (e por consequência o hobby em si) cada vez mais estranhos para quem olha de fora e acho que esse foi um fator para a não renovação do público. Enfim.

Na próxima postagem vou tentar dar uma acelerada, contando o que joguei (e o que se jogava) entre 94 e 97 (mais ou menos) e relatando a minha chegada à gibiteca Henfil (onde joguei por muitos anos, ganhei grandes amigos e expandi meu grupo).

PS: as fotos dos eventos não são minhas, foram encontradas via o Blog do Silvio C. Martins ( Roleplay ) que me direcionou para as seguintes coleções de fotos:

http://picasaweb.google.com.br/dlirajor/EIRPGs?feat=directlink

http://www.flickr.com/photos/13853417@N06/sets/72157618491715143/

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